Estudo da APG contribui para revelar perfil dos pós-graduandos da UFRGS
Estudo praticamente inédito sobre perfil socioeconômico com mais de 3.300 pós-graduandos aponta condições de estudo e de vida da categoria.
Porto Alegre, 26 de agosto de 2013
A Associação de Pós-Graduandos da UFRGS publicizou no dia 20 de agosto último em uma Assembléia de Pós-graduandos o estudo que conduziu no mês de maio de 2013 com mais de 3.300 pós-graduandos. O estudo foi pensado a partir da diretoria da entidade e teve o auxílio do CPD (Centro de Processamento de Dados da UFRGS) para sua aplicação eletrônico a partir do Portal do Aluno.
O estudo foi planejado para fornecer um conjunto de informações preliminares sobre o perfil socioeconômico dos pós-graduandos da UFRGS. Ele se justifica devido a grande ausência de informações desse tipo sobre o quadro dos matriculados em programas de pós-graduação no Brasil. Estudos sobre o perfil dos pós-graduandos são raros, na UFRGS um trabalho semelhante foi foi realizado em 2002-2003, há uma década, sob responsabilidade da professora Elsa Cristina de Mundstock (Instituto de Matemática da UFRGS). Com a apresentação do relatório preliminar da pesquisa apenas com os dados dos pós-graduandos stricto sensu participantes (2.605 estudantes) feito por Gabriela Blanco (coordenadora geral da APG-UFRGS) na assembleia revelou-se alguns dados surpreendentes sobre a situação dos pós-graduandos da UFRGS.
Moradia e situação familiar
O estudo revelou que apenas 37,8 % dos pós-graduandos pesquisados são da região metropolitana de Porto Alegre. A maioria, 63,4 % ou vem do interior do estado (39,3%) são oriundos de outros estados e estrangeiros (22,9%). A situação muda drasticamente quando os participantes respondem sobre seu local de residência atual. 84,9 % responderam que moram na região metropolitana de Porto Alegre (74,8 % na capital e 10,1% em outras cidades).
Ainda a respeito da situação de moradia, a maioria dos pós-graduandos paga alugueis com suas próprias rendas ou possuem casa própria (32,3% pagam alugueis e 31,8% possuem residência própria). 23,20 % moram com a família ou em imóveis de propriedade familiar, 9,5% moram em imóveis pagos por familiares. Esses dados indicam que a grande maioria dos pós-graduandos da UFRGS deslocam-se para Porto Alegre para fazer seus estudos. Além disso, a maior parte desses usam rendas próprias para custear alugueis ou sua casa própria.
O estudo mostrou que 18,6% dos pós-graduandos têm filhos. Desses 38,03% afirmaram ter filhos com até 4 anos de idade. Isso aponta para a urgente necessidade de vagas na creche da UFRGS para os estudantes de pós-graduação.
Estresse e depressão entre os pós-graduandos
Em novembro de 2012 o Jornal da Ciência, órgão da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), publico um artigo de Sérgio Arthuro que comenta uma pesquisa publicada na revista Nature sobre a questão da depressão entre os pós-graduandos ingleses. No estudo na Nature, comenta Arthuro,
“os principais sinais de depressão são: a) inabilidade de assistir as aulas e/ou fazer pesquisa, b) dificuldade de concentração, c) diminuição da motivação, d) aumento da irritabilidade, e) mudança no apetite, f) dificuldades de interação social, g) problemas no sono, como dificuldade para dormir, insônia ou sono não restaurativo (a pessoa dorme muito, mas acorda cansada e tem sono durante o dia).
Exatamente as mesmas questões foram submetidas aos pós-graduandos da UFRGS. Os resultados impressionaram pela sua grande incidência, mais da metade dos entrevistados afirmaram sofrer de algum dos sintomas mencionados acima. Dentre os problemas de saúde relacionados as condições psíquicas durante a pós-graduação, destaca-se os problemas no sono, insônia ou sono não restaurativo(50,4%). Taxas elevadas de outros problemas também se constataram sendo a diminuição da motivação e aumento da irritabilidade as mais mencionados, 41,2% e 37,3% das respostas, respectivamente.
As taxas impressionam pela sua incidência, mas não são propriamente uma revelação. O encurtamento do prazo para defesas e a demanda crescente dos programas de pós-graduação e dos órgãos de fomento pelo aumento da produtividade acadêmica são temas comuns entre as conversas dos pós-graduandos. Embora o estudo não possa ser conclusivo a esse respeito – até mesmo pela ausência de dados de série histórica sobre a questão – parece coerente apontar que o aumento das exigências de produtividade acadêmica estão tendo um impacto relevante na degradação das condições de saúde mental dos pós-graduandos.
Renda, situação financeira e perspectiva profissional
Dos pós-graduandos participantes na pesquisa, 59,5% afirma receber bolsas da CAPES/CNPq. Destaca-se que, entre os bolsistas, 77,5% indicaram que a bolsa é sua única fonte de renda. Ou seja, estão a viver exclusivamente com uma renda de R$ 1.500, os mestrandos, e R$2.200 os doutorandos. 46,65% dos pesquisados afirmam realizar algum tipo de trabalho em tempo integral ou parcial (35,11% em tempo integral, 11,54% em tempo parcial). Das atividades realizadas fora da pós-graduação, prevalecem as referentes à docente/pesquisador em universidade, servidor público (exceto docente) e atividades técnicas ou gerenciais em empresas privadas, com 21,8%, 21.3% e 16,4% das respostas, respectivamente.
Quanto à renda, o estudo destaca que 70,8% dos pós-graduandos, modalidade stricto sensu, não recebem auxílio financeiro da família. Sendo que destes, 10,1% ainda auxiliam seus familiares. Na análise dos diferentes níveis da modalidade stricto sensu, observa-se o progressivo crescimento deste percentual, passando de 53,1% no mestrado para 70,6% no pós-doutorado.
Com respeito ao projeto profissional, destaca-se o predomínio de respostas relacionadas à permanência dos pós-graduandos no ambiente acadêmico: 59,3% dos respondentes indicaram desejar trabalhar como docente na universidade (44,68%) ou continuar cursando a Pós-Graduação, em outra modalidade (14,69%).
Não mais deveres que direitos! Assistência estudantil e condições dignas de estudo aos pós-graduandos.
Uma das principais discussões referentes à pós-graduação em nosso país é o caráter da atividade que os pós-graduandos exercem diariamente nas universidades brasileiras. Por um lado, a atividade de pesquisa realizada durante o período em que se cursa a pós-graduação não é reconhecida como um trabalho, estando os pós-graduandos excluídos da obtenção de direitos básicos trabalhistas. Por outro lado, a situação de já terem cursado sua graduação e o fato de existirem bolsas de pesquisa, especialmente, para a pós-graduação stricto sensu, excluem os pós-graduandos de programas de assistência estudantil na maior parte das universidades brasileiras.
Contudo, sabe-se que as bolsas fornecidas pelos órgãos de fomento estão, há muitos anos, com seus valores defasados; que a possibilidade de conciliar o recebimento de bolsa com um vínculo empregatício ainda é ilusória e que o fato dos estudantes terem concluído a sua graduação não reflete uma mudança automática na sua situação socioeconômica. Assim, possíveis barreiras e dificuldades no acesso e permanência de estudantes na pós-graduação precisam ser diagnosticadas e combatidas com políticas específicas, a exemplo do já existente para a graduação.
Em algumas universidades a situação chega a extremos. Por exemplo, atualmente na UFRGS não há nenhuma espécie de assistência estudantil aos mais de seus 10.000 pós-graduandos. O único programa de assistência estudantil mantido pela universidade, algumas poucas vagas na Casa de Estudantes, foi extinto em fins de 2011 com o pedido de retirada em cinco dias dos últimos 6 pós-graduandos lá moradores!
Diante do exposto, a Associação de Pós-Graduandos da UFRGS realizou uma pesquisa sobre o Perfil Socioeconômico dos Pós-Graduandos da UFRGS, com o objetivo de obter subsídios para a discussão e formulação de um programa de assistência estudantil para os pós-graduandos desta universidade. Espera-se com a pesquisa possa qualificar as ações da APG e, especialmente, da Pró-Reitoria de Pós-Graduação da UFRGS (PROPG) e da Pró-Reitoria de Assistência Estudantil (PRAE), afim de que um número maior de estudantes possa acessar e permanecer na pós-graduação, contribuindo, desta forma, para a construção de uma ciência brasileira mais ampla e plural.
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